Novamente penso sobre
a imutabilidade de todos os ontens.
Não há vício tão bárbaro
quanto a obsessão de mudar o passado.
Não há maior tragédia
do que a não aceitação do tempo
que se foi.
Tempo este que evapora-se
entre as palmas das mãos,
dilui-se na elasticidade
do pensamento.
Não há cura
para o coração
que não se conforma
com o sofrimento presente,
coração que pulsa
firme a vontade
de apagar as fissuras
da própria memória.
Penso sobre as nuances
da existência
e na minha incapacidade
de lidar com a plasticidade
daquilo que é real.
Matéria prima,
dialogo comigo,
toda a vida dentro
do que aconteceu
e não muda jamais.
Eu sou
minha própria fatalidade
e o raciocínio
é meu pior inimigo.
Morro por ser e pensar,
padeço das minhas circunstâncias terrenas,
além do que foi e também será.
Vive em mim a agonia,
o desgosto de não poder
desenterrar nas dilatações
das estações aquilo
que me dói.
Destruo as possibilidades
de um respirar tranquilo,
noites bem dormidas
e dias mais dispostos.
Tudo que há em meu corpo
são pequenos registros cutâneos
do que tento inutilmente
esquecer e apagar.
A crueldade da minha violenta consciência
me aprisiona em entendimentos tiranos
sobre o significado dos ciclos da vida,
não sou mais capaz de enxergar
fluidez no tique taque do relógio.
O que ocorre comigo é,
talvez,
o pior dos castigos terrestres
e eu percebo um grito desesperado
me cortando a garganta,
implorando aos céus
pela paz que me negam
desde que meus grandes temores
se tornaram realidade.
Em vão penso o quão inútil
é o sentimento de temor,
quando o mundo lá fora
lamenta a ingenuidade
dos que cogitam qualquer controle.
A ilusão de defesa assusta os fracos.
Estive assustada.
Despreparada
para suportar o que é permanente.
Me questiono
se a simplicidade
das minhas interpretações juvenis
serão eternas.
Orando baixinho
para que a constância
da realidade possa ser como é,
sempre real,
mas nem tão sempre afinca
e feroz
no meu coração.
Minhas preces voltam-se
ao desejo de trégua,
ao menos um fragmento
de brandura
para minha mente,
mas sei que
não há saídas para os inconformados.