segunda-feira, 9 de novembro de 2020

meus sentimentos mais clandestinos

Meus sentimentos mais clandestinos me contaminaram com uma tristeza visceral que durou por estações a fio. 

Senti minha depressão incubada dentro de mim, crescendo entre meus órgãos e ranhuras. 

Fazia parte de mim 
como um uma embrião malformado,
torto 
e faminto. 

À noite me visitava com frequência, no escuro do meu quarto partia do meu ventre viscoso, passeava se divertindo nas sombras noturnas e eu observava acostumada. 

Essa coisa que crescia dentro de mim 
tinha meu rosto, 
mas não era eu. 

Eu jamais fui essa coisa  
que germinava em mim devagar 
e que perturbava minha vida. 

Essa tristeza silenciosa 
também era feroz, 
bárbara 
e destruidora. 

Arruinou conexões sinceras, despovoou meus pensamentos tranquilos e me esgotou por completo. 

De dentro pra fora 
eu a alimentei 
e me enfraqueci. 

Sinto que sobrevivi ao inferno 
ao matar minha relação mais duradoura, 
tóxica 
e tirana. 

Precisei matar algo que fazia parte de mim, dentro da minha carne, pulsando em minhas veias. 

Minha própria imagem gêmea, 
cravada em mim 
como verme parasita. 

E essa coisa mutante que adotava tantas formas ainda mora dentro de mim, mas não mais a sinto viva se nutrindo da minha vitalidade. 

Sinto que sobrevivi 
ao matar parte de mim.