Era manhã cedo quando me apaixonei por ti.
Eu, ave de rapina,
lancei minhas garras
à algo sem nome,
sem pronúncia.
Era cedo demais
quando me apaixonei por ti.
Absoluta certeza
- pensava eu -
das tantas palavras desajuizadas
que agora percorriam
soltas na minha cabeça.
Ele, ele, ele,
pensei esfomeada.
Precisei respirar fundo
uma,
duas,
três vezes
e olhar para
o ponteiro do relógio
mais quatro
para ter certeza
de que não havia sido
acometida com alguma espécie
de mal súbito
que me fazia delirar
tua existência.
Não sei se tão cedo
haveria causa
ou fundamento
dessa paixão acidental
que me acolhia de
braços abertos.
Engolida por
estes pensamentos
pensei com um salpicado
de mais calma
que não poderia negar:
me apaixonei por ti.
Passei meu café atordoada,
o mundo de um minuto a outro
parecia diferente.
Cortinas,
espaços vazios,
um vento corriqueiro
soprando os bigodes dos gatos.
Era assim tudo novo
e estrangeiro para mim.
Cenho franzido pensei:
não pode ser.
Me nego,
sou teimosa
e bato o pé
se verdadeiramente quiser.
Mas não,
não havia teimosia
no meu coração,
apenas certeza
da paixão esbaforida
por alguém
que nem conhecia por hora.
Por hora,
pensei novamente.
Bebi meu café,
como pode a paixão
ser tão dolorida?
Abrupta,
sem medo,
escora as batentes
do teu peito sem dó,
sem pedir licença
pra entrar.
Não é visita esperada,
não é de casa,
mas conhece tudo
com a palma e os dedos.
Está aqui dentro de mim.
Era manhã cedo,
agora é tarde
e o tempo passa
e continua.
O mundo está diferente.
Estranhamente familiar.
Eu quero ficar.